Conversar sobre assuntos polêmicos é sempre muito difícil e acaba não levando a conclusão alguma, porque sempre tendem a gerar opiniões diversificadas, seja por razões políticas, ideológicas, por dogmas, etc…
Se conversar sobre tais assuntos é difícil imaginem o que não será dar uma aula sobre um tema polêmico, que envolva questões religiosas, como a teoria da evolução; o aborto; o uso de camisinha, condenado por algumas Igrejas; a utilização de embriões na pesquisa e na terapia com células-tronco, entre outras.
O professor tem que ser muito responsável nesse momento, pois ele, às vezes inconscientemente, acaba se transformando em um formador de identidade e, por conseqüência, de opiniões. Esse professor tem que agir de modo a não induzir o aluno a ter um pensamento idêntico ao seu. Nesse caso, cabe ao professor simplesmente expor todos os fatos, os dois lados da moeda, e deixar o aluno pensar por si só e construir uma opinião própria.
No dia 29 de abril, nós do Ced. 03 do Guará passamos por isso. O tema que estamos trabalhando nesse semestre é embriologia, e ao chegarmos na parte de segmentação e gastrulação, não podíamos deixar de falar sobre células-tronco.
A grande dúvida que surgiu com a descoberta do poder dessas células é a seguinte: ” A partir de qual momento um aglomerado de células pode ser considerado vida?”. Muitas Igrejas condenam duramente a utilização de embriões nas pesquisas por considerarem-na um assassinato. Até dentro da própria comunidade científica surgiram divergências sobre as questões éticas envolvidas nessas pesquisas.
Então tínhamos que tratar esse assunto com muito cuidado para não induzirmos os alunos a nenhuma conclusão precipitada a respeito de um ponto tão delicado. Nesse contexto, resolvemos dar uma boa aula sobre essas células, abordando a sua biologia, quais a principais células, onde podemos encontrá-las e principalmente a importância delas, os tratamentos já existentes, o andamento das pesquisas em outros países e as descobertas mais recentes. Em relação à polêmica, explicamos qual o motivo das discussões, as alegações dos dois lados, e mostramos aos alunos diversas perguntas feitas por alguns dos protagonistas desse embate:
· "Será que é mesmo certo utilizarmos uma vida humana para salvar outras?"
· "O que define uma vida humana?"
· Será que um "aglomerado de células" é uma "vida"?
· A maioria das religiões considera "morto" um ser cujo cérebro parou de funcionar. Por que considerar um embrião como "vivo" se ele ainda nem possui neurônios?
E para saber a opinião dos alunos fizemos a seguinte atividade, exibimos algumas charges sobre o tema e pedimos para cada um deles escrever em uma folha de papel uma crítica para cada charge. Dessas charges, uma menospreza a inteligência dos políticos, outras criticam a Igreja e seus dogmas, e uma delas, em especial, ataca severamente as crenças e seus seguidores.
Em relação a essa charge, vista acima, aproximadamente 80% dos alunos simplesmente escreveram a mensagem que a charge trazia, não expressando uma opinião pessoal sobre ela. Dos 20 % que realmente fizeram uma crítica, somente cerca de 25% foram contra a opinião do chargista e 75% contra a opinião da Igreja. Entre esses comentários, tivemos alguns que se destacaram. Ei-los:
“Ela afronta a religião. Isso mostra como o uso das células-tronco traz conflito para a sociedade.”
“Deve-se usar a lógica e não as crenças herdadas ou construídas.”
“As crenças, ou seja, a Igreja, está decaindo por causa das inovações da tecnologia.”
“....é mais convincente a RAZÃO do que algo mítico, religioso, algo que não se comprova cientificamente. A razão é palpável, visível, na religião só se tem fé.”
Esses resultados, apesar de serem considerados numericamente inexpressivos, podem sinalizar uma mudança de pensamento em relação as outras gerações.
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